terça-feira, 15 de setembro de 2015

Cefaléia Crônica

            Eram nove horas quando o alarme tocou. A cama estava confortável e quente como um abraço nunca esquecido O lençol escorregava preguiçosamente enquanto ela fazia uma tentativa frustrada de se sentar. Ainda era cedo para sair da cama.
      As pupilas opacas correram para janela aberta. O tecido leve da cortina levitava como um vestido em movimento.
 A brisa quente estava convidativa para um passeio. Ela se imaginou fora dali, no parque ao lado da sua janela. Terminando mais um romance água-com-açúcar e imaginando se os casais que caminhavam juntos eram tão felizes e clichês também. Ela forçou o tronco enquanto apoiava os braços paralelamente ao corpo. Mas ainda era cedo para sair da cama.
            A enxaqueca martelava na cabeça de novo, pega desprevenida pelo alarme. E o calor só piorava a dor. Lembrava da época que vivia normalmente, sem ter os vasos capilares pulsando na têmpora. Quando conseguia sair à noite para se divertir sem ter a cabeça explodida pelos sons da cidade. Buzinas, som alto, gargalhadas. Como até o barulho do teclado parecia pancadas no cérebro. Foi se isolando a medida que a dor de cabeça ia se tornando mais freqüente. Depois de cinco meses e vários especialistas, sem melhora alguma, ela não saía mais de casa e mandou isolar acusticamente todo o apartamento. O único convívio com o mundo quando os analgésicos funcionavam, era aquela janela aberta para o pequeno parque silencioso.Seu milagre para a loucura do isolamento. Os amigos não a visitavam mais, porque tinham que manter silêncio absoluto. Não se interessava por mais ninguém quando imaginava a voz da pessoa ecoando e rasgando sua cabeça. Ela dedicava a vida a dor constante, como uma amante encarcerada. 
Cada detalhe monótono do quarto do pequeno apartamento parecia mais vívido agora, a tinta alva; os dois quadros com tema floral; o pequeno guarda-roupa de madeira escura, combinado com a cama e o criado mudo. Suas mãos tatearam debilmente o móvel procurando um copo de água, achou o frasco de calmantes quase vazio. Ela havia tomado alguns para a maldita enxaqueca que latejava todos os dias, como sinos infernais. Ela calculou, pela dosagem, que iria levantar depois das duas da tarde. Ainda era cedo para sair da cama.

            Eram nove horas quando o alarme de incêndio tocou.